É A EDUCAÇÃO, ESTÚPIDO!
Por Ricardo MurilhasReflexões sobre como o déficit educacional brasileiro nos mantém na segunda divisão do mundo.
Começo esta reflexão me explicando acerca do título deste artigo, para os mais desavisados. Longe de mim querer ofender alguém, apenas estou parafraseando o estrategista eleitoral do Bill Clinton, que, quando perguntado sobre se a Guerra do Golfo não seria o ponto nevrálgico da disputa eleitoral com George Bush, respondeu: “É a economia, estúpido!”
De fato, lá como cá, desde então a economia é o assunto central para se ganhar eleições presidenciais, mas aqui quero lembrar que depois de ganhar as eleições, todo governante deveria pensar no bem estar da nação. E não se pode pensar em conceito de nação sem um nível educacional que torne a sociedade mais evoluída.
Utilizando banheiros públicos por aí, já me deparei inúmeras vezes com avisos como “urine dentro do vaso” ou “dê a descarga após utilizar”, além de cartazes tutoriais com mensagens como “Aprenda a lavar as mãos”. Ora, avisos como estes serão mesmo necessários? Infelizmente, na nossa realidade parece que sim.
Trafegando pelas marginais da capital paulista me espanto com a montanha de pneus, sofás, geladeiras e todo tipo de entulho dragado dos rios Tietê e Pinheiros. Penso que não foram parar no leito do rio por obra da natureza e sim dos cidadãos.
Nos EUA é bem comum um fuzileiro fardado não precisar pagar a conta em estabelecimentos, muitas vezes recebendo uma salva de palmas, por sua atuação determinante na defesa dos ideais do Tio Sam. Aqui, em plena pandemia, vimos casos de profissionais de saúde agredidos no transporte público, quando iam ou voltavam de sua luta diária para salvar vidas, arriscando seu pescoço, e seus pulmões, em hospitais sem EPIs, respiradores ou qualquer condição.
Poderia passar horas aqui demonstrando situações como as descritas acima, mas este não é meu objetivo. A ideia aqui é mostrar que eles não são a causa da nossa situação enquanto sociedade e sim a consequência. Quer dizer, uma dose de educação poderia mitigar muitos dos nossos problemas.
Tive a curiosidade de contar quantos ministros da educação tivemos neste século, contando o que acabou de assumir. São 15 desde o ano 2000, ou quase 1 por ano. Em sua grande maioria políticos ou correligionários, economistas, mas pouquíssimos educadores ou gestores educacionais. Quer dizer, o Ministério da Educação (erroneamente chamado de MEC, pois há muito deixou de ser Ministério da Educação e Cultura) virou uma commodity, um cargo para ser preenchido por um aliado. Não há projeto de médio-longo prazo. O resultado disso fica evidente quando se faz uma comparação entre Brasil e Coreia do Sul.
O Exemplo Sul-Coreano
Não há nenhuma novidade na comparação entre a evolução de Brasil e Coreia do Sul ao longo das últimas décadas, mas é sempre uma excelente fotografia daquilo que deixamos de nos tornar. Senão vejamos: em 1960 o PIB per capta da Coreia era a metade do brasileiro. Imbuídos da missão de tornar o país asiático uma potência, viveu-se a partir de então um grande investimento em educação básica, que, com o passar dos anos, foi sendo modulado também para os ensinos médio e superior.
Não por coincidência, nas últimas décadas empresas coreanas foram ganhando espaço em segmentos extremamente competitivos, como eletroeletrônicos, com protagonismo da Samsung e LG, veículos, como Hyundai e Kia e tantos outros mercados. Da mesma forma a gastronomia coreana passou a ser moda no mundo. Isso sem falar na indústria cultural, importante geradora de recursos que massificou fenômenos, como Psi, K-pop e, pasmem, ganhando Oscar de Melhor Filme com o notável Parasita (na verdade 6 indicações e 4 estatuetas: Melhor Filme, Diretor, Roteiro Adaptado e Filme Estrangeiro).
Olhando com misto de inveja e indignação, se há 60 anos tivéssemos seguido a mesma linha, imaginem o que teríamos conseguido com a riqueza e a diversidade da nossa culinária, cultura, música, artes em geral. E nos negócios, onde empreendedores brasileiros são heróis que carecem de todo tipo de apoio, estímulo e ambiente favorável.
Agora, colhemos o que não plantamos
Todo o nosso descaso com a educação tem um preço, muito além do chamado custo-Brasil. Num momento de crise, como a pandemia que nos assola, a falta de educação do brasileiro cobra caro.
Dia desses, em plena quarentena, vi um grupo de jovens na rua compartilhando um narguilé! Não vou entrar no mérito sobre os efeitos nocivos de se fumar narguilé, mas compartilhar um em plena pandemia? E aquele idiota que bombou nas redes sociais porque se recusou a usar máscara na farmácia e mesmo quando ganhou uma da balconista a colocou sobre a cabeça? O mais impressionante é que assisti a esta cena pelos dois ângulos, gravada por pessoas da fila e também pelo próprio sujeito (não há nada mais patético que um ignorante que tem orgulho da sua ignorância). E a legião de pessoas numa fila quilométrica para entrar num shopping em São Vicente, como se fosse a Black Friday do fim dos tempos?
Comparando os números da pandemia no Brasil e na Coreia do Sul, a gente entende o que o déficit educacional ocasiona. Aqui, mesmo com números subnotificados e quase nada de testagem, temos até esta data 1.2 milhão de casos e 54 mil mortes. Lá, 12.500 casos e 282 mortes. Para termos de comparação, a população coreana é aproximadamente 25% da brasileira, mas os casos são 1% e as mortes 0,52% das nossas. E reiterando, aqui há uma enorme subnotificação, enquanto lá, praticamente nenhuma.
Educação não é só assunto de governo
Sabemos que “é a economia, estúpido!” Mas já passou da hora de entendermos que se a educação não dá votos, será ela que vai nos tirar da segunda divisão. Isso passa pelas escolas, claro, mas pode e deve ser iniciado nos lares. Começando por coisas básicas, como urinar dentro do vaso, dar a descarga, lavar direito as mãos e praticar o respeito e a empatia para com aquele que usará o banheiro depois de você. Jogar o lixo no lixo e não no rio não parece ser algo tão difícil.
Nem vou entrar no mérito aqui, mas a valorização dos professores é assunto para ontem e a opção por massificar o ensino superior com faculdades de fundo de quintal só está enriquecendo alguns e gerando uma legião de analfabetos funcionais e diplomados.
Enquanto isso, o PIB per capta da Coreia do Sul, que era metade do brasileiro em 1960, agora é 3 vezes maior que o nosso.